Tendo lhe falado sobre as coisas que deveriam ser o
assunto da sua meditação, eu lhe falarei a seguir, brevemente, de que maneira
você deve fazer isso. Eu não me demorarei em prescrever-lhe nenhum longo ou
exato método de meditação, tanto porque isto não estaria de acordo com a minha
intenção de brevidade, como porque as pessoas com as quais eu agora estou
tratando não seriam capazes de observar tais regras. Se alguém desejar este
tipo de ajuda pode transferir os conselhos que são oferecidos sobre outro assunto
no meu livro sobre o Descanso, para o assunto que trataremos agora.
1. Não espere que tais pensamentos
venham por si mesmos à sua mente, mas disponha-se propositadamente a considerar
estes assuntos. Tome algum tempo para chamar sua alma para considerar o seu
presente estado e sua preparação para a eternidade.
Se um ímpio, Sêneca, podia obrigar-se cada noite a
prestar contas a si mesmo pelo mal cometido, e pelo bem a que se omitiu no dia
findo, como ele declara que fazia cotidianamente, por que, mesmo um homem não
convertido, que dispõe dos incentivos que agora encontra em nosso meio, não
pode meditar sobre o estado da sua alma? Mas eu sei que um coração carnal é
excessivamente avesso a considerações sérias, e detesta ser incomodado com tais
pensamentos. Além disso, o diabo fará o que puder para impedi-lo, pessoalmente
ou por intermédio de outros. Mas, se pelo menos os homens fizessem o que está
ao seu alcance, a situação poderia ser bem melhor do que é. Está você disposto
a, pelo menos aqui e ali, se retirar deliberadamente das demais companhias para
um lugar isolado, e ali colocar o Senhor diante dos seus olhos, e convocar a
sua própria alma a uma estrita prestação de contas sobre os assuntos que eu
acabo de mencionar, e dedicar-se a exercitar a sua razão sobre estes assuntos?
Está você disposto, quando for à igreja para ouvir, a obrigar-se
propositadamente a este dever de meditação como algo realmente necessário?
2. Ao meditar sobre estas coisas,
esforce-se para despertar sua alma, e para ser muito sério em todos os seus
pensamentos.
Não medite sobre estes assuntos da salvação do
mesmo modo que o faria ao meditar sobre um assunto ordinariamente trivial, o
qual você não considera ou dá importância; mas lembre-se de que a sua vida
depende disso, e até mesmo a sua vida eterna. Assim, evoque os seus mais
sinceros pensamentos, e desperte todos os poderes da sua alma, e não permita
que eles fujam, mas ordene-os à ação; então, coloque os diversos pontos que eu
mencionei diante de você, e, quando pensar sobre eles, esforce-se para ser
afetado por eles em algum grau, conforme sua suma importância. Assim como
Moisés disse a Israel ‘Aplicai o vosso coração a todas as palavras que
hoje testifico entre vós, para que ordeneis a vossos filhos que cuidem em
cumprir todas as palavras desta lei. Porque esta palavra não é para vós outros
cousa vã, antes é a vossa vida' (Dt 32:46,47). E assim como Cristo
disse, ‘Fixai nos vossos ouvidos as seguintes palavras... '
(Lc. 9:44), assim eu lhe digo: deixe que estes assuntos sobre os quais você
pensar penetrem no seu coração e sejam profundamente enraizados, a fim de que
vivifiquem os seus sentimentos.
E se o seu coração escapulir desta obra, e outros
pensamentos rastejarem para dentro da sua mente, e você se enfastiar dessas
considerações antes que elas realizem sua obra em você, atente para que não se
entregue à preguiça ou má vontade, mas lembre-se que esta é uma obra que
precisa ser realizada, e assim mantenha seus pensamentos nestas coisas até que
o seu coração seja comovido e aquecido dentro de você.
E, se apesar de tudo, você não conseguir despertar
seus pensamentos à seriedade e sensibilidade, coloque para si mesmo duas ou
três destas despertadoras questões:
(1) O que aconteceria com o meu corpo,
meu estado, ou nome, se eu não os considerasse diligentemente? Se alguém apenas me
prejudicar, quão facilmente posso meditar nisso, e quão prontamente eu o sinto;
e quão dificilmente eu esqueço! Se o meu bom nome for desonrado, e eu for
desgraçado, eu posso pensar nisso noite e dia. Se eu perder uma propriedade, ou
tiver algum sofrimento no mundo e vier a experimentar a decadência, eu posso
pensar a respeito com grande sensibilidade. Se eu perder um filho ou um amigo,
eu poderei tanto sentir como pensar sobre isso. Se a minha saúde declinar, e a
minha vida estiver em perigo, eu estarei bem disposto a pensar seriamente. Não
deveria eu pensar com igual seriedade sobre os assuntos concernentes à vida
eterna? Não deveria pensar eu sóbria e diligentemente nestas coisas, quando o
corpo e a alma estão em jogo, e quando o assunto diz respeito ao meu gozo ou
tormento eterno?
(2) O que aconteceria se eu apenas
ouvisse o próprio Filho de Deus me convocando a arrepender-me e a ser
convertido , concluindo a Sua exortação com a séria expressão, ‘ Aquele que
tem ouvidos para ouvir, ouça' ? Isto não me levaria a sérias considerações
sobre o meu estado? Por que, então, que isto que Ele fez quando estava no
mundo, e que continua a ser feito pelos seus embaixadores, não deveria levar-me
à séria consideração?
(3) O que aconteceria se eu soubesse
que a morte está às minhas costas e pronta para me arrastar , e que eu estaria no
outro mundo daqui a menos de uma semana? Eu certamente começaria a considerar
estas coisas com empenho. Por que, então, eu não faço isto agora, quando sei
que não posso controlar uma hora sequer do curso da minha vida, e que é certo
que dentro de pouco tempo esta hora virá?
(4) O que aconteceria se os meus
olhos apenas fossem abertos para ver aquilo que eu digo crer, e que é
certamente verdadeiro? Sim, se me fosse dado um vislumbre da majestade
do Senhor, e eu pudesse ver os santos em alegria e glória, e ver as almas
perdidas em miséria, e se ouvisse suas lamentações, não induziria isto o meu
coração à meditação? Oh, com que diligência eu não pensaria então nestas
coisas! Por que então eu não faço isto agora, visto que estas coisas são tão
certas como se eu as estivesse vendo, e visto que muito em breve as verei?
Muitas outras questões despertadoras como estas
estão à disposição, mas eu apenas toquei brevemente nestas coisas que são as
mais comuns e óbvias, e que mesmo os mais ignorantes destas realidades estarão
habilitados a delas fazer uso. Com tais pensamentos você pode dar partida ao
seu coração negligente, sacudi-lo da sua insensibilidade, e despertar seus
pensamentos à ação.
Fonte: Extraído de Medita Estas
Coisas . Editora Clássicos Evangélicos, Ananindeua-PA:1990. Traduzido
por Paulo Anglada do Original inglês Directions and Persuasions to a
Sound Conversion (Directions One to three) Extraído de Monergismo.